domingo, 1 de julho de 2012

Noites Carmins - Parte IV

Quando as notícias sobre o massacre ocorrido no casarão de Willian e nas mansões de outros distintos senhores de toda a Região Metropolitana foram veiculadas nos jornais locais, os habitantes de Saint Michel se aprofundaram em seu sentimento de medo. Os prefeitos de todas as cidades da região pediram a intervenção da Força Nacional de Segurança, um destacamento especial formado pelos melhores homens do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. Em Saint Michel, os membros da Força Nacional de Segurança chegaram no dia posterior às invasões, em dois momentos, um destacamento no meio da tarde e outro após o cair da noite. Os 60 militares designados para a cidade foram recepcionados pelo prefeito, e ocuparam as instalações do quartel da Polícia local, localizado na rua da orla.

Naquela noite, Matheus saiu de seu refúgio e andou alguns passos pelas ruas de Saint Michel, quando reparou que uma quantidade maior de veículos da Polícia rondava pela cidade. Intrigado com isso, ele decidiu fazer uma visita a Sara, para se certificar de que estava tudo bem com ela. Assim que chegou a uma quadra do prédio onde a garota morava, o estrangeiro percebeu que havia ali uma grande concentração de policiais, então apertou o passo na direção do edifício. O céu estava encoberto de nuvens naquela noite. Matheus observou que os poucos populares que se arriscavam a sair de casa, motivados pela curiosidade, estavam usando roupas de frio. Quando finalmente chegou próximo ao prédio de Sara, ele viu que a construção tinha sido lambida pelo fogo horas antes, mas que ainda permanecia de pé. Um grupo de homens da Força Nacional de Segurança, do Corpo de Bombeiros e da Polícia local circundava o prédio.

Matheus se esgueirou por uma viela situada na lateral do edifício e conseguiu entrar pelos fundos, onde havia pouca vigilância. Dentro do prédio não havia ninguém. As entradas de alguns apartamentos estavam sem portas, mas contavam com faixas de isolamento colocadas pelas autoridades. Matheus entrou em cada apartamento do primeiro andar, olhando em volta com olhos apertados e cheirando o ar. Como não encontrou nenhum sinal de Sara naquele pavimento, ele repetiu sua busca nos andares superiores. Enquanto Matheus subia as escadas, a fumaça que ainda persistia atrapalhava um pouco sua visão. Pedaços do teto que tinham caído sobre os degraus dificultavam a subida. Quando chegou ao quinto andar, o estrangeiro sentiu, em meio ao cheiro de fumaça, o aroma do perfume que Sara usava na noite em que jantaram juntos. A fragrância saía pelos buracos de uma porta que tinha sido quase que completamente consumida pelo fogo. Matheus atravessou a porta e entrou no apartamento que ela deveria encerrar, olhou em volta de si e percebeu que a televisão e outros móveis tinham sido quebrados antes de serem queimados. Houve luta, imaginou. Um rastro vermelho percorria o chão, indo da sala de estar até o único quarto que havia ali. Matheus seguiu o rastro e entrou no quarto, atravessando a porta aberta. O cheiro está mais forte aqui, pensou no interior do quarto. Ali, ele viu que na parede adjacente a cama de Sara havia o desenho de uma espada, feito de uma substância vermelha, e alguns traços que pareciam formar uma estranha inscrição. Ao ver aquele quadro, o homem endureceu seu semblante e cerrou seus dentes em fúria, deixando à mostra seus caninos superiores, longos como presas. Virou-se e saiu apressadamente.

***

Algum tempo depois, no quartel da Polícia de Saint Michel, os membros da Força Nacional de Segurança se reuniram num pátio reservado exclusivamente para eles. Aquele que parecia ser o comandante do grupo, um homem negro, escanhoado, careca e que usava óculos sobre seus maliciosos olhos negros, andou de um lado ao outro, perscrutando os homens em formação. Depois, parou na frente das filas de soldados e disse:

– Senhores, nosso ofensor tem base nesta cidade, a apenas dez quilômetros daqui. Seu ataque levou à destruição os fracos com os quais eu dividia o poder.

O comandante trocou olhares com os homens que encabeçavam as seis filas de membros da Força Nacional de Segurança. Estes tinham olhos ávidos como os de abutres, e eram extremamente pálidos. Após alguns segundos de silêncio, o discurso do comandante continuou:

– Os senhores, especificamente, se mostraram mais aptos que os que tombaram sob o golpe de Morgan, portanto, serão meus novos imediatos assim que aniquilarmos nosso inimigo. Depois de acabarmos com Morgan, daremos cabo dos Grandes que me traíram, e os senhores ficarão em seus lugares – sorrisos maldosos brotaram nos seis rostos macilentos. – Agora vamos senhores! E fiquem a vontade para se alimentar de todo o gado que encontrarem!

– Sim, senhor Belmonte! – Gritaram os homens perfilados. Belmonte virou-lhes as costas, atravessou o portão do pátio do quartel e dirigiu-se a um dos seis jipes militares que estavam estacionados do lado de fora. Seus soldados o seguiram e ocuparam todos os veículos.

Um por um, os jipes em que estavam os homens de Belmonte iniciaram um cortejo do quartel da Polícia até a praça central. Ali, os veículos pararam e alguns dos soldados saltaram e andaram em direção meia dúzia de pessoas que não estavam suficientemente assustadas para permanecer em suas casas. Caso a sensatez fosse uma das virtudes daqueles populares, eles viveriam o suficiente para ver o sol nascer no dia seguinte. Em vez disso, eles estavam ali aguardando pela sua morte, mesmo que não o soubessem. O ataque dos vampiros foi violento. Cada ser humano foi cercado por cinco das criaturas da noite, e tiveram seus corpos destroçados pela ferocidade daqueles que deles se alimentavam. Depois de terem seu apetite saciado, os vampiros voltaram para os jipes e continuaram seu trajeto na direção oposta ao mar.

***

Na base de Morgan, vampiros e serviçais estavam a postos em vários pontos da propriedade, tanto fora quanto dentro do casarão. O rival de Belmonte encontrava-se na mesma sala de estar na qual, em noites anteriores, sugara todo o sangue da jovem loira raptada na rua da orla. Ele trazia nas mãos sua espada com rubis cravejados no cabo negro e bainha de ouro, e estava cercado por dez vampiros e por Sandro. Sara estava no mesmo local, pendurada em uma espécie de cruz em forma de X, constituída por duas tábuas de madeira presas em aberturas feitas no chão. As roupas da garota foram rasgadas. Marcas de presas distribuíam-se por todo o seu corpo e hematomas figuravam em seus olhos e nos cantos de sua boca.

– Senhor Morgan, Belmonte já deve estar se aproximando com o seu exército! – Exclamou Sandro. – O Senhor está certo de que é sensato esperá-lo aqui?

– Meu caro Sandro, infelizmente, sua lealdade não é igualada por sua confiança! Você mesmo confirmou que o amiguinho desta garota é a chave para nossa vitória – disse lançando um olhar malicioso sobre Sara.

– Sim, mas... Se não tivermos força suficiente para derrotá-lo? Além disso... Sofreremos um duplo ataque. Será que conseguiremos resistir?

No momento em que Sandro terminou de questionar Morgan, explosões atraíram a atenção de todos os ocupantes da sala de estar para a grande janela que dava para a entrada da propriedade. As cortinas abertas permitiram que fossem vistos pelo menos três focos de incêndio além dos muros, sugerindo que bombas foram lançadas para fora. Após outra explosão, o portão que encerrava a propriedade tombou, e alguns homens atravessaram a abertura que ficou em seu lugar. Os defensores de Morgan alvejaram os primeiros invasores, mas uma segunda leva conseguiu derrubar os que estavam mais próximos do portão caído, atirando neles com suas armas.

Do lado de fora, Belmonte estava na parte externa do cerco que seus homens impuseram ao casarão de Morgan, gritando ordens que eram repetidas pelos seus seis capitães, que estavam mais próximos da batalha. O líder dos vampiros da Região Metropolitana observou que a segunda leva de seus lacaios que atravessaram os portões voltou ensandecida, vampiros e serviçais correndo com seus corpos em chamas, gritando e esbracejando desesperadamente.

– Atirem neles! – Bradou Belmonte. – Não deixem que eles cheguem próximos à linha de cerco!

Prontamente, os soldados de Belmonte atenderam e seus homens queimados caíram no chão, depois de alvejados pelos companheiros que estavam mais próximos. Um terceiro grupo atravessou o portão, depois um quarto. Gritos, barulho de tiros e de explosões enchiam o ar, enquanto fogos brilhavam sobre a escuridão da noite, dentro e fora da propriedade de Morgan.

No interior da mansão de Morgan, o vampiro golpista e a sua comitiva se sobressaltaram com o barulho que uma das portas da sala de estar emitiu ao ser violentamente aberta. Logo em seguida, Matheus entrou na sala. Seus cabelos estavam soltos e desgrenhados, seus olhos acinzentados estavam inflamados de ódio e sua boca estava entreaberta, permitindo que os outros ocupantes da sala vissem suas presas.

– Finalmente, você apareceu! – Exclamou Morgan, com um sorriso no rosto. – Aquele que de tempos em tempos caminha sobre a terra durante as Noites Carmins, sobre as quais reina a lua de sangue. O primeiro dos vampiros: Caim! Vejo que você ainda se lembra do idioma de Nod, pois compreendeu as instruções deixadas por Sandro.

2 comentários:

  1. roberto abraços, continue com seus pitacos. está otimo. prossiga investindo no blog - abraços lamarque

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    1. Muito obrigado, Lamarque! Que bom que você gostou de minhas publicações. Sucesso pra você também!

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